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Próximos passos pós-conta-covid

Marcos Madureira e Paulo Gabardo*
10 de julho de 2020 | 06h00

Manifestando uma postura responsável e prudente, as distribuidoras de energia, representadas pela ABRADEE, aderiram ao financiamento da CONTA-COVID, em apoio aos esforços do Ministério de Minas e Energia (MME) e da Agência nacional de Energia Elétrica (ANEEL), a fim de contribuir para a proteção dos efeitos da pandemia nos demais segmentos do setor elétrico.

Essa ampla adesão simboliza a confiança do segmento de distribuição, que atua como ponte entre os demais elos e o consumidor final. As empresas esperam de que as indefinições quanto seu próprio equilíbrio serão equacionadas com o mesmo empenho e com a visão inequívoca da necessidade de preservação de sua atividade frente aos efeitos extraordinários e imprevisíveis causados pela pandemia.

É momento de avançar na agenda de recomposição econômica das distribuidoras, concluindo a segunda fase da Consulta Pública 35 da ANEEL com a maior celeridade possível, reconhecendo que a situação atual não se insere no risco ordinário dos contratos de concessão. Esses contratos se fundam na confiança entre poder público e concessionária, desincumbindo a União do ônus de prestação direta do serviço público de distribuição. O que permite, por meio de uma regulação por incentivos madura, o compartilhamento com os consumidores de ganhos de produtividade e de qualidade, valores que dão concretude ao interesse público de preservação da atividade concedida.

Cenários como o que estamos vivendo, que extrapolam o comportamento normal da economia e do mercado e para os quais não há ação possível de enfrentamento pelas distribuidoras, exigem a recomposição adequada do equilíbrio econômico das empresas, justamente para que os prestadores e seus investidores mantenham o habitual engajamento na melhoria do serviço prestado ao mínimo custo possível, o que resulta em benefício aos consumidores.
O tamanho das redes de distribuição espalhadas nas mais diversas áreas de concessão para levar energia e bem estar ao sempre crescente número consumidores não diminui com a pandemia. A forte redução de consumo de energia, portanto, tem efeito excepcional e assimétrico, pois reduz drasticamente a receita sem que os custos correspondentes acompanhem essa redução.

Essa visão quanto à excepcionalidade da situação atual e a necessidade de tratar seus efeitos foi reconhecida pelo MME explicitamente no tema da sobrecontratação de energia. Em função da rigidez dos contratos de compra de energia para atendimento aos consumidores finais e da insuficiência dos mecanismos de alívio, o MME reconheceu que o excesso de contratação decorrente da queda de mercado ocasionada pela pandemia da COVID-19 é involuntário, ou seja, sujeito a repasse tarifário.

Nessa perspectiva, já há o reconhecimento de que a variação do mercado atendido pelas distribuidoras por efeito da pandemia exige tratamento excepcional para preservação do equilíbrio das concessões. A mesma rigidez observada na compra de energia, que motivou o MME tratar os efeitos da pandemia no excesso de contratos, deve basilar a ANEEL na adequada recomposição econômica da atividade de distribuição, cujos custos também se apresentam rígidos.

Todavia, se para o caso da recomposição econômica da distribuição a mitigação possível se dá pela constituição do direito para recuperação tarifária em momento futuro no qual a capacidade de pagamento dos consumidores estiver recuperada, para o caso da sobrecontratação há uma série de medidas que podem ser implementadas de forma transitória ou estrutural para reduzir o potencial impacto tarifário do excesso de contratos de energia.

Dentre as propostas apoiadas pela ABRADEE está a descontratação de térmicas com alto custo variável, o que poderia ser feito mediante leilão de maior deságio ofertado pelos geradores sobre a receita residual dos contratos. Há várias térmicas cuja probabilidade de acionamento até o fim do contrato é muito baixa e outras com proteção judicial para não gerar, mas que continuam constando no conjunto de contratos rígidos das distribuidoras.

Outra medida é a desjudicialização do risco hidrológico, que depende de aprovação do Projeto de Lei 10.985 de 2018, em estágio avançado de discussão no Congresso. O excesso de contratos suportado pelas empresas e seus consumidores é vendido no mercado de curto prazo, que há anos enfrenta elevado grau de inadimplência. Essa inadimplência reduz o alívio financeiro que seria proporcionado por essa revenda da sobra contratual.

A ANEEL poderia também restaurar etapas de oferta de descontratação por geradores nos mecanismos de descontratação centralizados promovidos periodicamente (MCSD), aprimorando a regulação para evitar que a descontratação promova aumento de subsídios no setor.

Medidas de modulação de entrega de energia também poderiam ser implementadas, deslocando no tempo o excesso de contratos para um momento em que o respectivo volume de energia se mostrar necessário. Isso poderia ser feito por livre adesão de vendedores, mediante compensação por extensão de outorga ou reduções de obrigação.

A Agência poderia, ainda, permitir cessões livres de contratos entre distribuidoras, o que permitiria a reacomodação de volumes extremamente representativos de sobrecontratação observados em uma concessão para absorção em outra área com maior mercado, na qual o mesmo volume de energia teria pouca repercussão. Essa proposta, que pode ser regulada pela ANEEL sem qualquer alteração legal, é parte do PLS 232 de Modernização do Setor Elétrico, cuja aprovação célere também equilibraria a alocação de custos entre consumidores livres e regulados, estabelecendo a repartição dos efeitos da sobrecontratação involuntária e a separação do lastro e da energia na expansão do parque gerador, hoje sustentada pela rigidez de contratos com os consumidores regulados.

Também no âmbito da ANEEL está a discussão da cobrança adequada dos custos da rede aos titulares de geração distribuída. A possibilidade de compensar, com a energia gerada e exportada à rede, os custos da infraestrutura de distribuição utilizada para fazer essa exportação, da sobrecontratação involuntária e do financiamento realizado pela CONTA-COVID tende a criar ais um incentivo distorcido para a alternativa da geração própria, agravando ainda mais o desequilíbrio das distribuidoras e penalizando os consumidores que não dispõem de recursos para tirar proveito desse sinal econômico equivocado.

*Marcos Madureira, presidente da ABRADEE

*Paulo Gabardo sócio fundador e diretor-presidente da i4 Economic Regulation

*Link da matéria: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/proximos-passos-pos-conta-covid/

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