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Reequilíbrio de contratos na Aneel deve atingir R$ 6 bi

Pandemia reduz Ebtida das distribuidoras em 25%, diz Abradee

Por Rafael Bitencourt e Daniel Rittner — De Brasília

As distribuidoras de energia elétrica fecharam a conta do impacto causado pela pandemia no fluxo de caixa das empresas em 2020. Elas calculam a necessidade de um reequilíbrio econômico-financeiro de R$ 5,5 bilhões a R$ 6 bilhões em seus contratos.

A Abradee, associação que reúne 40 distribuidoras do país, estima redução média entre 20% e 25% no Ebitda – sigla em inglês para lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização – das companhias. “Em alguns casos, porém, houve perdas até da ordem de 70%”, diz o presidente da entidade, Marcos Madureira.

Se pedido for atendido plenamente, tarifa dos consumidores subiria até 3%, mas medidas podem atenuar reflexo

Essas estimativas serão levadas pelas distribuidoras à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), no âmbito da consulta pública nº 35, aberta com o intuito de construir uma metodologia para a análise dos pedidos de reequilíbrio das companhias.

Se as perdas forem plenamente reconhecidas, os consumidores poderão arcar com aumento médio de 2,5% a 3% nas contas de luz, por meio de revisões tarifárias extraordinárias aplicadas individualmente. “O que buscamos é a possibilidade de ter os registros adequados e nossos direitos recompostos”, alega Madureira.

O executivo vê espaço para uma série de medidas que podem amortecer esse eventual impacto na tarifa dos consumidores. Ele cita algumas possibilidades: incentivos à renegociação dos contratos de fornecimento de energia entre geradoras e distribuidoras, leilões para antecipar a descontratação de térmicas acionadas com óleo combustível (mais caras) e repactuação do cronograma de usinas atrasadas.

De mais a mais, segundo Madureira, pode-se também avaliar o diferimento das revisões extraordinárias ao longo dos próximos anos como forma de atenuar o reflexo percebido pelos consumidores. “São questões que cada empresa poderá definir com a Aneel no momento em que for estabelecido o cálculo.”

O importante mesmo, afirma, é que a agência reguladora reconheça o desequilíbrio causado pela pandemia em três frentes: perda de receitas na chamada “parcela B” das tarifas (consequência da queda de consumo); sobrecontratação involuntária (as distribuidoras se comprometeram a comprar uma quantidade energia que ficou bem acima da demanda efetiva e precisam honrar esses compromissos), receitas irrecuperáveis (alguma inadimplência acaba se tornando permanente e parte das unidades consumidoras deixa de existir).

“Se não houver isso, o risco é afastar os investidores”, enfatiza Madureira, acrescentando que essa percepção seria prejudicial ao processo de privatizações e concessões não apenas no setor elétrico, mas na infraestrutura como um todo. “O grande debate é se esse evento [a pandemia] faz parte dos riscos ordinários que são assumidos por qualquer empresa em um contrato”, afirma.

De acordo com o presidente da Abradee, a “Conta Covid” – criada em junho para dar liquidez ao setor – serviu para que as distribuidoras honrassem pagamentos pré-existentes, como encargos, custo de transmissão e compra de energia. Elas funcionam como uma porta de entrada para o fluxo de pagamentos no sistema, já que têm relação direta com os consumidores, mas ficam com apenas 18% do valor recolhido nas tarifas. O resto vai para geradoras, transmissoras, impostos, tributos e encargos setoriais.

Para evitar uma situação de insolvência, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) liderou um consórcio de instituições financeiras na montagem de um empréstimo de R$ 15,3 bilhões às distribuidoras. Os recursos estão sendo liberados em parcelas, até dezembro, e o pagamento da operação ocorrerá em 54 meses – além de 11 meses de carência.

“O lado financeiro foi solucionado pela ‘Conta Covid’ a partir de ativos regulatórios das próprias empresas. Restou solucionar o desequilíbrio econômico”, diz Madureira. O Tribunal de Contas da União (TCU) apoiou a decisão de não incluir o  reequilíbrio dos contratos no empréstimo. A consulta pública nº 35, aberta pela Aneel em meados de agosto, dura 45 dias e vai até 5 de outubro. Uma metodologia final deverá ser definida ainda neste ano.

As distribuidoras viram com apreensão a proposta inicial publicada pela agência. A Aneel propôs que apenas dois itens possam ensejar pedidos de reequilíbrio: mercado e inadimplência – a sobrecontratação de energia acabou não sendo considerada. Os parâmetros usados nos dois itens também desagradam a Abradee, que congrega empresas responsáveis por 97% do mercado regulado.

Um caminho paralelo – mas pouco provável – para solucionar a questão é a MP 998, medida provisória publicada no início de setembro, que está tramitando no Congresso Nacional. Ela traz mecanismos para evitar um “tarifaço” em distribuidoras das regiões Norte e Nordeste, além de limitar subsídios para novos projetos de fontes renováveis (como usinas eólicas e solares), mas recebeu uma emenda do deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG).

A emenda propõe determinar à Aneel garantir “neutralidade econômica-financeira” às distribuidoras, por causa dos efeitos da pandemia, e estabelece: “[Fica] vedada a formulação de exigências e de critérios de admissibilidade que dificultem, reduzam, imponham contrapartidas ou retardem e a efetiva fruição do direito à recomposição tarifária extraordinária pelas concessionárias de distribuição”. Esse aditivo ao texto original da MP 998 dificilmente vai receber apoio do governo na tramitação.

*Link da matéria: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/09/16/reequilibrio-de-contratos-na-aneel-deve-atingir-r-6-bi.ghtml